O consumo do tabaco tende a aumentar no país, principalmente no seio da camada mais jovem, apesar de Angola não ter plantações nem indústria tabagista.
Segundo a directora-geral do Instituto Nacional de Luta Contra as Drogas (INALUD), Ana da Conceição Mamede, que falava ao Jornal de Angola, a propósito do Dia Mundial sem Tabaco, que se assinala hoje, apesar das estatísticas débeis a nível das várias instituições, dá-se conta de que o número de fumadores de tabaco tende a crescer devido aos pedidos de ajuda que a instituição recebe.
Formada em Psicologia e Sociologia, Ana da Conceição Mamede explicou que, em 2023, o INALUD registou um total de 17.868 utilizadores de drogas de forma geral. Deste número, cerca de 200 são consumidores de tabaco.
“Mas isso não significa que em Angola apenas 200 pessoas usem o tabaco. Estes são os que aparecem no INALUD, em busca de ajuda, por conta das consequências nefastas dessa substância tão nociva à saúde”, sublinhou.
Consequências a longo prazo
Segundo a directora-geral do INALUD, para muitos, o tabaco serve como droga inicial. Como as consequências geralmente são sempre a logo prazo, frisou, as pessoas acham normal e relaxante o seu uso, por isso, dificilmente procuram os serviços do Instituto.
“Quando nos procuram, é porque, além do tabaco, também estão associadas outras drogas, como o álcool e liamba, que lhes causaram já estragos à saúde e não só e querem deixar, mas não conseguem sem a ajuda de uma instituição que trabalhe no processo de desintoxicação e reabilitação de toxicodependentes”, disse.
Em relação às faixas etárias mais afectadas pelo uso do tabaco, indicou que vai dos 14 aos 34 anos, sendo o sexo masculino em maior número.
Luanda é a província com mais consumidores de droga (8.322 casos), onde está incluído o tabaco.
Apesar do número reduzido de consumidores de tabaco, Ana da Conceição Mamede lembra que Angola já esteve melhor, porque a preocupação com o uso do tabaco era reduzida.
Mas, nos últimos anos, frisou, tem-se assistido a um crescimento no número de fumantes, porque o tabaco que se consome em Angola vem da vizinha Namíbia e de outros países próximos, que têm plantações e indústrias de tabaco.
País sem plantação de tabaco
Em Angola, segundo a directora-geral do INALUD, existe a consciência de que a plantação de tabaco danifica gravemente os solos, podendo levar anos para depois se praticar outras culturas de subsistência humana.
“Então até agora, estamos numa condição em que os nossos solos não sofrem com a plantação do tabaco. Não tendo matéria prima, também não temos indústria tabagista, o que, apesar de tudo, nos ajuda muito”, assegurou.
Segundo Ana da Conceição Mamede, ao contrário do que se pensava que o tabaco era para famílias pobres ou desestruturadas, hoje, a situação é transversal. Por isso, vê-se pessoas de vários estratos sociais a consumirem o tabaco e outras drogas mais pesadas. O dia Mundial sem Tabaco foi instituído em 1987, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objectivo de conscientizar os governos e a população sobre os malefícios do cigarro para a saúde e sobre as doenças e mortes evitáveis relacionadas com uso do tabaco.
Oito milhões de pessoas morrem por ano
Oito milhões de pessoas morrem por ano, em todo o mundo, vítimas das consequências causadas pelo uso do tabaco, de acordo com os dados do último relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) publicado em 2023.
Deste número, sete milhões são resultado do uso directo do tabaco, enquanto 1,2 milhão é dos chamados fumadores passivos (os não fumantes, mas que ficam expostos ao fumo).
De acordo com o relatório da OMS, a tendência do consumo de tabaco a nível do mundo tem estado a diminuir ao longo dos anos. Em 2022, um em cada cinco adultos era fumante, menos do que em 2000, quando o número era de um em cada três pessoas.
Apesar da diminuição no consumo do tabaco, a OMS refere que até 2023, o mundo ainda registava cerca de 1.25 bilhão de fumantes.
Consequências para as crianças
Em entrevista ao Jornal de Angola, a propósito do Dia Mundial sem Tabaco, que se assinala hoje, a chefe do Departamento das Doenças Transmissíveis e não Transmissíveis da OMS em Angola, Fernanda Alves, disse que a exposição ao fumo do tabaco além de afectar os adultos, também, é extremamente nociva para crianças.
Fernanda Alves explicou que, anualmente, cerca de 65 mil crianças morrem em todo o mundo, vítimas de doenças atribuíveis à exposição passiva ao tabaco.
Nos adultos, acrescentou, o fumo passivo pode provocar graves doenças cardiovasculares, respiratórias e cancro do pulmão.
Já em bebês, prosseguiu Fernanda Alves, a exposição ao tabaco pode causar morte súbita ou baixo peso ao nascer. Em mulheres grávidas, provoca aborto, alterações placentárias, malformações fetais e restrição no crescimento do feto.
A alta funcionária da OMS em Angola indicou que a epidemia do tabagismo, além de ser uma causa importante de doenças, também é de empobrecimento, porque quase 80 por cento dos 1.25 bilhão de fumantes em todo o mundo vive em países de baixa e média renda, onde a carga das doenças relacionadas com o tabaco é mais pesada.
Especialista em Saúde Pública, Fernanda Alves informou que os usuários de tabaco que morrem prematuramente privam as suas famílias de terem maiores rendimentos, aumentam os custos dos cuidados de saúde e impactam negativamente no crescimento económico de qualquer sociedade.
Protecção das crianças
Em relação ao lema escolhido pela OMS para este ano, Fernanda Alves disse que é “Proteger as crianças da interferência da indústria do tabaco”. O objectivo, segundo Fernanda Alves, é apelar às sociedades e governos para a necessidade de se adaptar políticas que protejam as crianças e adolescentes das práticas manipuladoras da indústria do tabaco.
Segundo Fernanda Alves, a indústria tabagista está muito agressiva, porque tem estado a conceber produtos com sabores de frutas combinados com designer atraentes e coloridos para despertar, desde cedo, o interesse das crianças e adolescentes a consumir o tabaco.
As indústrias tabagistas, alertou, também estão a produzir os cigarros electrónicos e outros produtos nocivos, como a chicha, que cada vez mais atraem os jovens.
Esta prática, sublinhou, coloca em risco a saúde e desenvolvimento do futuro de qualquer nação, porque o tabaco é extremamente nocivo à saúde, principalmente das crianças”, realçou a responsável.
Alerta da OMS
Segundo Fernanda Alves, em Dezembro de 2023, a OMS emitiu um alerta enfatizando a necessidade de todos os países adoptarem acções urgentes que visam a proteção das crianças e adolescentes dos perigos destes produtos nocivos à saúde.
Questionada sobre o papel da OMS no combate ao uso do tabaco, disse que, em 2003, a Assembleia Mundial da Saúde adoptou a Convenção Quadro sobre o Controlo do Tabaco (CQCT), que entrou em vigor em 2005, da qual Angola é signatária
Este acordo internacional, disse, estabelece um conjunto de normas e políticas para reduzir o uso do tabaco e o seu impacto na saúde pública a nível do mundo.
“Ao longo das últimas décadas, a implementação desta Convenção Quadro tem conduzido a resultados satisfatórios em vários países, em particular em termos de consciencialização, prevenção, reabilitação, fiscalização e diminuição do número de consumidores dos produtos do tabaco”, acentuou.